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terça-feira, 29 de junho de 2010

Estamos sós?

Um dos temas das provas de conclusão do ensino médio na Itália foi a questão "Estamos sós?".

A resposta do DVD:




Estamos sós? (no universo?) A questão é mais antiga do que todas as ficções literárias e cinematográficas poderiam adivinhar. Por exemplo, Epicuro escrevia já no século três antes de Cristo: “existem infinitos mundos similares e dissimilares do nosso (...) nos quais, continuava, há muitas criaturas vivas e plantas e muitas outras coisas parecidas com as quais vemos”. É decerto verdade que Epicuro não se referia a planetas em órbita em torno de sóis desconhecidos (o cosmo dos gregos excluía essa possibilidade), mas em mundos atômicos, invisíveis aos olhos humanos.

Resta, todavia, a forte sugestão literária e a base para tantas especulações posteriores. Assim, quando a revolução copernicana, como sabemos, destruiu a imagem de um cosmo à “medida do homem”, para dar lugar a um espaço potencialmente infinito, também foi possível introduzir a hipótese de que talvez esse espaço contivesse também infinitos mundos. Uma concessão que deveria parecer absurda (além disso, para Lutero já parecia absurdo que a terra se movesse: “deveria perceber, observava, do mesmo modo como percebo quando a carruagem em que me sento está se movendo...”). No fundo a Bíblia conta que Deus criou um só mundo e o povoou em um tempo finito. Como conciliar a narrativa bíblica com a hipótese de infinitos mundos (fossem, contudo, invisíveis, como aquele de Epicuro ou similar ao nosso)?

O exemplo ilustra o quanto apenas o esboço de uma resposta negativa para a nossa questão poderia trazer consequências profundas e perigosas para nossas concepções religiosas e sociais, até mesmo do modo como observamos o mundo e a nós mesmos. De fato, a milênios de distância de Epicuro, o problema continua em aberto.

Lévi Strauss observou certa vez que o caráter do momento de encontro entre europeus e habitantes das Américas, no século XV só poderia se repetir no momento de encontro entre um ser humano e um ser de uma civilização alienígena. Até agora, limitei-me a tratar da hipótese de outros “mundos”, mas não comentei sobre seus habitantes. No fundo, a fascinação inexaurível que a questão “estamos sós?” provoca no homem comum está em sua capacidade de evocar a ideia de um “outro” com quem poderia entrar em contato, tentar uma comunicação e por sorte instaurar um diálogo, de um modo menos desastroso do que aquele ocorrido entre astecas e conquistadores.

Mas quem seriam os conquistadores e quem seriam os conquistados, no dia seguinte do encontro entre nós e “eles” (se esse dia virá)? E depois, por que a relação entre o eu e o outro deveria seguir sempre a mesmíssima dialética?

Em suma, numerosas interrogações morais se amontoam a tantos problemas (em física, biologia, semiótica) evocados pela possibilidade de vida em outros planetas, pois ainda não saímos do terreno das hipóteses. Mas sobre essa hipótese alguém como Kant (enfim, não foi qualquer um) teria apostado muito:

“Se fosse possível resolver a questão mediante uma experiência qualquer, eu estaria pronto a apostar todos os meus pertences na idéia de que pelo menos em um dos planetas que vemos existem habitantes. Para mim, então, o fato de que mesmo outros mundos sejam habitados não é simplesmente uma opinião, mas é uma fé convicta (pela certeza de tal crença, eu arriscaria de fato muitas vantagens da vida)”.

Poderíamos até concluir, parafraseando o filósofo de Konigsberg: "a lei moral dentro de mim, o céu estrelado [e habitado] sopra de mim”.



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