O segundo, sobre o qual eu soube primeiramente pelo fofo do Dahmer, posteriormente via twitter do Ministério da Cultura, há, para mim, uma relação muito próxima do que os especialistas do primeiro evento debatiam.
Quando, há duas semanas mais ou menos, soube que Laerte viria ao Rio para receber a ordem do mérito da cultura, corri pelos jornais à procura de alguma notícia. Na véspera, até, pesquisei e nada encontrei. O twitter do MinC sinalizou, então, o que ocorria. Quarenta homenageados. Quarenta artistas das mais diversas mídias e públicos, homenageados no Rio de Janeiro. Não apenas brasileiros. Agualusa, Mia Couto, Boaventura Sousa Santos, Manoel de Oliveira são os lusófonos que conheço.
Carmem Miranda, Raul Seixas e Bispo do Rosário entre os homenageados in memoriam.
Zeca Pagodinho, Gerson King Combo, Ângela Maria, Fernanda Abreu e José Miguel Wisnik, Deborah Colker...
Tantos, tantos.
A abrangência da lista denota muito bem a política democrática do MinC, que, como foi lembrado no evento no BNDES, já começou, mesmo que de forma tímida, a quebrar a centralização cultural no eixo sul com a distribuição de pontos de cultura pelo Brasil. Na quarta-feira, a ativista Oona Castro, do Intervozes e do Overmundo, apresentou um mapa com essa distribuição. Mesmo com muita falta, ainda, pelo Centro-Oeste e extremo norte (se bem que exatamente na chamada "Amazônia vazia"), essa política teria como objetivo de dar meios da própria população criar o seu "conteúdo".
Afinal, o conteúdo cultural brasileiro de grande acesso, tem sido sistematicamente filtrado pelos canais de acesso - leia-se saqueados, adaptados, banalizados, monetizados pela Globo e seus colegas de nicho.
Alguém me diga, por favor, como as tevês apresentaram a entrega das medalhas, título esse tão importante. Nem sabia que ele acontecia todos os anos, nada, nada... Como não tenho tevê, corro olhos pelos jornais online, e esses citam apenas a presença das "celebridades", Dilma lá e Lula também, quem vaiou, quem aplaudiu, quem não ousou comentar. Nada sobre o caráter simbólico dessa premiação, nada sobre o porquê dessa lista ser tão heterogênea.
Porque, se eu me lembro bem, pra muita gente cultura ainda é erudição, e os homenageados, em toda a sua genialidade, estão, em grande parte, recolhidos no gueto das artes bastardas e populares.
Lembro quando fingia aprender música no Villa Lobos e algum professor fez o elogio da erudição, que é arte técnica, diferente da arte que qualquer um poderia fazer. Claro, a técnica é algo a ser adquirido, é necessária, e não me desfaço da erudição (logo eu, uma "intelectual"? - leia-se a eterna nerd) mas ninguém pode negar que esses artistas não sejam dotados de técnica, mesmo fazendo a arte popular ou bastarda (obs.: o corpo docente, pelo menos quase todos com quem estudei, tinham uma visão menos preconceituosa do popular).
Essa ordem valoriza justamente a arte em geral em seu caráter amplo; esses artistas, nomeados cavaleiros da cultura, são oficialmente declarados nosso patrimônio (não imaterial, como tanto se falou no tal evento do BNDES, porque a gente também sua e se cansa fazendo arte; dizer que é imaterial desmerece de todo o trabalho técnico e artístico).
Um grande viva a todos os homenageados; ninguém lhes tira esse mérito.
Aliás, concordo com o que um fã comentou no blog do Laerte:
Os pés e os passos
Nas ruas agitadas de fim de tarde
Dizem tudo o que há a saber sobre a cidade:
Bastaria que os políticos e cientistas sociais
Trabalhassem no chão
(Boaventura Sousa Santos)
Eu que sei lá dessa coisa de medalha até passei a simpatizar com essa agora que tu recebeu ela. Tipo, contigo recebendo ela, quem sai ganhando mais é a medalha, pois na real é tu que agrega valor a coisa, não o contrário. Parabéns anyways