Não lembro mais que escritor ou jornalista ou quem quer que fosse comentou sobre seu espanto ao descobrir que havia, de certo modo, "escapado" ao 11 de setembro, mesmo vivendo em NY. Espantava-se de toda a comoção que não havia vivido, sendo sua desculpa a distância que mantinha dos aparelhos de comunicação. Mesmo sendo um autêntico novaiorquino, vivendo ali no décimo primeiro dia do setembro de 2001, não sentia a tragédia como os outros, as ruas lhe pareciam normais, assim como os que encontrava "fora" daquela realidade projetada pela tv.
É cada vez mais difícil escapar das comoções públicas com os meios tradicionais de informação. A comoção, aliás, torna-se um elemento de coesão, a tragédia comum une os povos (ao que Quintana dirá que os melhores amigos se conhece às quartas-feiras, fora de qualquer luto). A urgência de rumores se faz, portanto, pela manutenção de uma sociedade. Mortos a "canção popular", os rituais religiosos, assumem seu lugar a balbúrdia, o sussurro, o murmúrio.
Seria mais interessante se tais vozes fossem aquelas ouvidas pelo nosso Conselheiro Aires, ou por Étienne, aquele rumor de onde surgirão vozes imperativas da mudança. Não, essas vozes maquinais, engenho humano, mas cada vez menos humanizantes. Um sonho futurista de Marinetti ou Russolo, apenas máquinas de fazer barulho (1).
... "a transformação da música em barulho (rumor) é um processo planetário que fez a humanidade entrar na fase histórica da brutalidade total. A brutalidade se manifesta primeiramente com a onipresente brutalidade acústica: os automóveis, a motocicleta, a guitarra elétrica, as britadeiras, os altofalantes, as sirenes. A onipresença visual não tardaria a vir."(2)
As onipresenças seriam, talvez, as falsas urgências de nosso tempo, que busca a cada momento a nova comoção que fará ressurgir um espírito nacional. Algo que faça sentir um pouco de emoção que não seja o tédio da rotina, um amor tranquilo, a melancolia.
Laerte, sobre a música. |
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É por isso que fujo dos fogos de artifício.
(1) Os Intonarumori, instrumentos pré-Pascoalinos (digo um precursor de Hermeto Pascoal) de Luigi Russolo, que imaginava um instrumento que cantasse a cidade, o futuro.
(2) Milan Kundera, via sua personagem Sabina, em A Insustentável Leveza do Ser. Barulho, no texto, seria talvez burburinho (sugestão de B. Azevêdo), música de elevador, a música de fundo.
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